sábado, 27 de setembro de 2008

As [Muitas] COISAS do CHICO

“Poesia com marca pessoal e de extrema sensibilidade. Exuberância plástica das metáforas, revelando uma sensibilidade para o dizer/ver que se espraia em telas e imagens igualmente de alta fatura estética” (Antônio Carlos Secchin).


As palavras do poeta, crítico, organizador de antologias e professor titular da UFRJ, Antônio Carlos Secchin[1] traduzem, abundantemente, a riqueza do imaginário criativo do artista Assis de Mello.

Assis de Mello - poeta, biólogo, professor e pesquisador da UNESP (Campus de Botucatu / SP) - difunde as belas linhas de suas escritas no blog intitulado Coisas do Chico.

Em Coisas do Chico, o leitor encontra não apenas versos, imagens, canções... Mas versos, imagens e canções que dão formas a poemas em elevada esteticidade paisagística, conceitual e rítmica.

Há na poesia de Assis de Mello um rico manancial temático, imagístico e semântico: seres, estados emotivos e intersubjetividades, memórias da infância... E, caleidoscópios de signos colorem os múltiplos sentidos das muitas “Coisas do Chico”.

Há musicalidade, dicções quebradas em versos curtos e irregulares, aliterações e trocadilhos que provocam maior ludicidade aos textos, produzindo um efeito humorístico à escrita, gostoso de se ler.

Há evocação e valorização à natureza, mas não a natureza idílica comum aos árcades líricos que cantavam as dores do bem perdido nos nobres palácios citadinos da burguesia...

Nos versos de Assis de Mello, a natureza não é figuração. É essência, vida, razão e movimento da própria existência. A paixão e o respeito ao Ecossistema perpassam as suas linhas sensivelmente construídas e movem o leitor para a consciência de sua responsabilidade perante o Planeta. É como se seus versos dissessem: “observa, leitor, a beleza da libélula, sapo, jacaré, flor; da serpente, girassol, beija-flor... da criança, mulher, homem, das mil faces do amor"!

Poesia com apurada consciência humana, artística e ecológica. Rimas e cadências não-usuais, metáforas, paisagens e melodias que, juntas, dão vida às aquarelas do poeta.

Passemos, leitor, para algumas das muitas “Coisas do Chico”:

Apnéia


A tarde acorrentada
a um cano de torneira
e a noite mouca


À manhã
nem me ouso referir:
a claridade ofusca

Uma dama sentada à sombra
embala o vento que me foi roubado



(In: http://coisasdochico.blogspot.com/2008/09/rotina.html)



Ocarina


O sopro morno
__________nas entranhas
__________da argila
__________dura

o enlevo crescente

os dedos leves
___________nos gentis prelúdios
___________de um dedilhar de mulher


o calor das mãos,

tudo
reinventa o segredo das conchas

Algo se avulta
___________no oco

o novo reaviva o velho

e o som leve do hálito
___________partido
rompe o hímem do tempo

e crispa a pele do silêncio


- libélulas, pardais
___________rebrotam
do horizonte


da melodia
___________afloram
os presságios


(In: http://coisasdochico.blogspot.com/2008/08/enlevo.html)


Marinha


Uma alma corrugada
de tantos vieses


- jararaca ilhoa
no raso do chão


Manhãs sem sol
________Uma espreita
________de pedra


Vez ou outra
um barco aponta
na borda do arco


mas não
________atraca


e todos os faroleiros se foram
________numa certa manhã

________endiabrada
________de sal


Um cochicho de vento
________Ressona
no umbo
e na boca das conchas


Farfalho


(In: http://coisasdochico.blogspot.com/2008/08/solides.html)


Ars Poetica Truncata


Não se refira
a uma mulher
como poeta
_________diga poetisa


Deixe poeta ao marmanjo
criador da ampulheta
_________da baioneta
do estrondo da nau
_________de corveta


do ogro, do malogro
_________do rabo do capeta


O homem
come e deleta
chame-o poeta


__________A mulher martiriza
__________numa torre de Pisa
__________que seja poetisa


__________- e mesmo por ir
__________abilhada de brisa

__________e por ser tudo de bom
__________aúra-masda, pitonisa –


Além do mais
repare nisto:


nas noites de vento e lua cheia
em que os sininhos das varandas

reinam no desmando


__________/- corre, Maria
__________________o macarrão tá queimando! /

________Mulheres...

(In: http://coisasdochico.blogspot.com/2007/04/alegoria-infantil.html)


Um Olhar Sobre as Letras


Rasgo
meu silêncio
de
sargaço
e breu


Como aquietar-me
Neste
Mar
de versos mínimos


___________se cada célula
___________do plâncton
___________cria seu próprio
___________panteão?


Fios de encantamento
também cosem
oceanos


(In: http://coisasdochico.blogspot.com/2008/05/blindagem.html)



Assis de Mello, além de lecionar, pesquisar e se dedicar à poesia, entrega-se, nas horas vagas, às artes plásticas. Nesta postagem todas as aquarelas são obras do autor. Para conhecer um pouco mais das Coisas do Chico, o Novidades & Velharias sugere uma visita ao blog do poeta (http://coisasdochico.blogspot.com/). E-mail para contato: gryllus57@gmail.com.

Nota:

[1] A referência de Antônio Carlos Secchin à poética de Assis de Mello fora extraída do blog “Coisas do Chico”.


11 comentários:

  1. Poxa, Hercília !!
    Fiquei emocionado.
    Que presentão você me deu !!
    Você me elogiou, mas quem escreveu bonito foi você !!
    Quanta generosidade !!!
    Se eu disser que "te amo" vai te dar muito problema em casa ? rssss
    Um beijo,
    Chico

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  2. Caro Assis,

    Eu quem devo agradecer-lhe pela boa oportunidade de leitura, de aprendizagem artística e ecológica.

    Fico muito contente por você apreciar a matéria. Escrever sobre a obra de um poeta “vivo” é sempre um desafio e requer cuidados, principalmente quando o objetivo não é realizar uma “crítica”, mas contribuir para despertar o gosto, o conhecimento estético e o universo emotivo-conceitual do autor.

    Sua poesia é riquíssima e escolher os textos para composição desta seleta foi uma tarefa bastante difícil, já que todas as escritas existentes no “Coisas do Chico” são de excelentes qualidades, frutos das mãos habilidosas de um sensível artesão.

    Obrigada por me dispor as suas lindas aquarelas para composição desta matéria e também por suas expressões de afeto.

    Abraços,

    Hercília Fernandes.

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  3. Olá HF, olá Assis de Mello.

    Adorei a postagem: quanta arte nas "Coisas do Chico"!!!

    A poesia de Assis apresenta uma natureza visual desde a disposição dos versos.
    Creio que tamanha beleza e plasticidade deriva também das habilidades de um artista que sabe dosar bem formas, cores e traços para criação de sua tela.

    Muito boa escolha HF!

    Assis de Mello é, como vc disse, um excelente artesão.

    Abraços nos dois.

    Maria Clara.

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  4. Esse espaço é tudo de bom! Sempre visito e adoro as postagens da Hercília sobre poetas, obras e afins...

    Parabéns Assis de Mello pela elevada beleza plástica de sua arte literária!

    Vendo esta seleta e as demais, pensei em desafiar a HF: - Que tal, Hercília, vc nos ofertar uma seleta de sua própria poética?...

    Penso que qdo o autor escolhe os textos, a leitura possui um sabor diferente, pois o artista escolhe as escritas que lhe são mais significativas. Assim são com as obras completas qdo selecionadas pelos "próprios" escritores.

    Pense nessa sugestão de postagem, ok?

    Novamente, parabéns pela belíssima matéria sobre as múltiplas artes do Chico!

    Abraços,

    João P.

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  5. Ah..., lhe encaminhei um singelo texto por email, espero não cansar sua vista com as minhas linhas rascunhadas... (rsss).

    Saudações,

    João P.

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  6. Olá amigos [Maria Clara e João Pedro].

    Agradeço as visitas e o carinho de vocês.

    Todos os autores já postados no Novidades & Velharias produzem textos de excelente qualidade. E o meu contentamente é saber que, como leitora, tenho contribuído para a difusão de suas artes.

    Abraços e obrigada pelas expressões de afeto e demais coisas.

    Hercília (H.F).

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  7. Olá, amiga Hercília.

    Que beleza de postagem!

    A maneira como você apresenta o artista, nos acrescenta tanto conhecimento... Você faz uma análise que não cansa o leitor; muito pelo contrário. Ficamos com um "Ahh... Acabou...?".

    Maravilhoso o trabalho de Assis de Melo. Você o descreveu brilhantemente. Destaco o trecho:

    "[...]É como se seus versos dissessem: “observa, leitor, a beleza da libélula, sapo, jacaré, flor; da serpente, girassol, beija-flor... da criança, mulher, homem, das mil faces do amor"! Poesia com apurada consciência humana, artística e ecológica."

    Enquanto educadora, fica o meu apelo: vamos levar as "Coisas do Chico" para as salas de aula!! [Falo dos ensinos Fundamental, Médio e Superior].

    Parabéns, Assis de Mello. Parabéns, amiga.

    Grande abraço.
    Taninha

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  8. Poxa pessoal,
    Obrigado pelas palavras; estou com o ego inflado e o queixo erguido. Agora me ocorreu pedir para que todos os meus inimigos (são tantos !! rss) venham ler tudo isso que vocês escreveram pra que morram de inveja.
    Hercília, esta foi a primeira avaliação mais profunda que recebi vinda de quem realmente entende de literatura.
    [Aviso aos eventuais diabéticos que visitam o Novidades e Velharias: a Hercília é um doce].
    Chico

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  9. Olá Taninha. Obrigada, amiga, por sua visita calorosa: você mora em meu coração!

    João Paulo, perdão pela troca do segundo nome. É que meu caçulinha chama-se João Pedro... Eis o motivo da confusão!

    Assis de Mello, gostei de ser chamada de "doce". Mas, espero que a guloseima não seja de côco (risos).
    Perdão... lembrei-me que o Jô Soares acha bastante apurada essa iguaria da culinária nordestina...

    Bem, amigos, muitíssimo agradecida pelas gentis visitas e expressões de afeto.

    Forte abraço!

    Hercília F.

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  10. Ah, Hercília... não se preocupe!

    João Paulo ou Pedro se parecem mesmo...

    Abraços poetisa!

    João P.

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  11. Não se preocupe poetisa... "O que é um nome"?...

    Saudações,

    João P.

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